DECANTAÇÃO
Quanto mais morro, mais vivo.
A planície dá preguiça.
Nem sei mais rezar o terço e me
sinto mais perto de Deus, de tudo.
Não estrago, descasco e vou até o talo.
Não desperdiço, lapido.
Me lambuzo do sumo,
puxo até o último trago.
Eu filtro.
ERUDIÇÃO
Incondicional, arbítrio de uma potência.
Fugaz, o pensamento rola
que nem rolimã.
A mudança é constante e
contemporiza a ânsia de ser.
DECUPAGEM
Era domingo
e ela descascava a tarde feito laranja.
A faca afiada deslizava sobre a fruta
e a vida vinha em bagos.
APLANAÇÃO
Banhada em lágrimas
com os olhos pra lua
e o corpo na compreensão do limite,
sentou-se na privada
e entoou uma cantiga pueril.
O silêncio pede grito,
a palavra pede ação,
o medo, construção,
a sensibilidade requer janela.
Ela deu descarga na razão.
FERTILIDADE
Imbuída pelas águas lentas
percorrendo seu corpo,
aplanava-se banhando-se no rio.
O sol da manhã dourava a sua pele,
anunciando mais um facho de luz.
Suspiros unidos ao canto dos pássaros,
manifestava uma idéia de mundo.
O vento soprava assanhando a paisagem
e toda a terra naquele momento
ia dando vida às sementes.
VORAGEM
Chego ao precipício,
hora de compreender o vácuo
desse mundo sei-lá-o-quê...
Nem é fim da estrada
e essa inquietação me consome.
E eu ainda nem sei,
se é nessa parada
que eu quero ficar.
DEVENIR
A celeridade atropela hora,
anuvia vista,
tira o sabor da fruta,
desorienta a rota dos sonhos
e deixa a barca em contratempo.
Amiúde prisão de um passado
Com o curso em minueto, hoje
ela se esparrama nas virginais margens,
se lança na relva do Olimpo
e não se extravia por intermúndios da utopia.
Ela se entrega à distração.
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